quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Perplexidade


Publicado na Folha de Londrina, edição de 13/02/2013 - www.folhadelondrina.com.br
Por: Celso Ming

Há enorme perplexidade dentro do governo com a disparada da inflação.

Nos últimos dias, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, deu declarações que não são do seu estilo. Reconheceu que está "desconfortável" com a escalada dos preços e admite que essa inflação persistirá nos próximos meses. Por enquanto, põe fé em que lá pelo final deste ano, voltará a a convergir mais ou menos espontaneamente para a meta.

A estratégia de esperar pra ver parece perigosa. Não está claro se o governo Dilma está em condições de enfrentar o estresse de uma inflação acima de 6% ao ano por mais cinco ou seis meses. Além disso, está operando muito próximo dos limites. Não há folga para enfrentar imprevistos nem o que o então deputado Tancredo Neves chamava de "o imponderável".

Do ponto de vista das atuais autoridades, essa inflação aí já é parte do imprevisto e do imponderável. Nem o Banco Central nem a Fazenda esperavam por tanto. No último Relatório de Inflação, editado em dezembro, o Banco Central projetou para todo o ano de 2013 uma inflação de apenas 4,8% - numero que, pouco mais de um mês depois, aparece como fortemente irrealista. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, por sua vez, vinha apontando a baixa ou relativa estabilidade dos preços internacionais das commodities como fator decisivo para redução das pressões inflacionárias internas.

Em outras palavras, todo o governo Dilma vem sendo surpreendido pelos fatos. Apostou todas as fichas na forte reaceleração da economia e vem trombando com a sucessão de pibinhos. Anunciou grandes investimentos, mas não consegue agilizá-los. Proclamou que a informação seguiria comportada sem a necessidade de novos antídotos e, no entanto, vai sendo atropelado por esses números preocupantes do IBGE. Imaginava que a desvalorização cambial (alta do dólar) devolveria a competitividade ao setor produtivo, mas não consegue garantir o câmbio real (descontada a inflação) pretendido.

Se é surpreendido pelos fatos, é óbvio que o governo não conduz o processo. Está, sim, sendo conduzido por ele.

Às vezes as autoridades dão sinais que percebem a desarrumação dos fundamentos da economia. Mas não conseguem garantir nem disciplina orçamentária, nem inflação na meta, nem o câmbio prometido, e muito menos o crescimento econômico projetado.

Basta ver a série recente das estatísticas do IPCA para saber que, ao menos por seis meses, a inflação anual tenderá a ficar acima dos 6,0%. É um período longo demais para que o Banco Central e a Fazenda sigam somente divergindo e se omitindo mutuamente, vendendo essas diferenças como prova de independência recíproca.

Caso as despesas públicas sigam o ritmo previsto; caso o câmbio não possa ser usado como âncora dos preços; e caso o Banco Central siga impedido de puxar pelos juros, o ajuste se fará com mais inflação e menos crescimento econômico.

O problema é que essas coisas cobram um preço. Por enquanto, a presidente Dilma ostenta uma enorme poupança política. As classes médias brasileiras parecem satisfeitas porque hoje têm mais emprego, compraram carro, se alimentam melhor e, se não viajaram para Miami, já estão providenciando o passaporte.

Enfim, a conta ainda não foi apresentada. Mas pode começar a ser na hora mais imprópria para o governo, às vesperas das eleições de 2014.

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 PERPLEXITY
There is enormous perplexity among government with the inflation raise.

In these last days, Alexandre Tombini, Central Bank President, made statements out of his style. He recognised being "uncomfortable" with the prices raise and admits that this inflation will persist during the next months. By now, he has faith that by the end of this year inflation will converge more or less spontaneously to the target.

The strategy of wait seems dangerous. It is not clear whether Dilma´s government is in conditions to face the stress of an inflation above 6% per year for more five or six months. Besides, it is operating too close to the limits. There is no room to face unforeseen nor what the former Deputy Tancredo Neves called "the imponderable".

From the current authorities point of view, this inflation is already part of imponderable and unforeseen. Not Central Bank nor Department of Treasury were waiting a so high number. In the last Inflation Report, edited last December, the projection made by Central Bank for the whole 2013 was of only 4,8% - number that, less than a month later, looks strongly unrealistic. The Treasury Minister, Guido Mantega, in his turn, was pointing the low or relative stability on international commodities prices, as a decisive factor for reduction of internal inflationary pressures.

In other words, the entire Dilma government has been surprised by the facts. They bet all chips on strong economy reacceleration and they are bumping in a succession of "little GNB - Gross National Product". They announced big investments, but fail speed them up. Promised inflation would be under control without the need of new antidotes and, however, has been hit by the concerning numbers of IBGE. They imagined that the devaluation (raise of dollar) would give competitiveness back to the productive sector, but canno ensure the real exchange (discounted inflation) desired.

If surprised by the facts, obviously the government does not lead the process. It is been led by it.

Sometimes, authorities give notice signs that clutter the fundamentals of the economy. But cannot ensure budget discipline, target inflation, promised exchange and less the projected economic growth.

Enough to follow recent IPCA statistics to know that, for at least six months, annual inflation will tend to be 6,00% up. It is a too long period to the Central Bank and Treasury keep diverging and omitting themselves mutually, selling those differences as proof of reciprocal independence.

In case public expenses keep pacing the foressen rhythm, in case exchange cannot be used as an anchor to the prices, and in case Central Bank be unable to pull the interests, the adjust will be made with more inflation and less economic growth.

The problem is those things change a high price. By now, President Dilma boasts a huge political savings. Brazilian middle classes look satisfied because now they have more jobs, bought more cars, feed themselves better and, if they didn´t travel to Miami, they are already getting passports issued.

Finally, the bill has not been presented yet. But it may be in the most inappropriate time for the government, in the eve of Elections for 2014.