A convite do Professor Moacir Vicentin, em setembro estive
na FECEA, em Apucarana, conversando com
os alunos sobre o tema acima. Segue a transcrição do que conversamos, e que
gostaria de dividir com vocês também.
Iniciei no comércio exterior por susto. Isso mesmo, porque
em 1989, quando eu recém havia completado 20 anos, e procurava emprego em Porto
Alegre, fui apresentada à empresa onde iniciaria minha carreira na área,
através de um contato de minha mãe. Esse amigo, que ela não via há muito tempo,
administrava uma empresa exportadora de pedras semi-preciosas e estava
contratando.
Da conversa, surgiu o fato que eu estava procurando
colocação em Porto Alegre, para juntar-me à minha mãe e irmã, que haviam se
mudado para a capital enquanto eu ainda
permanecia no interior do estado. Naquele dia, descobri que eu tinha talento
para negociação.
Como eu não tinha experiência, a oferta inicial era bem
baixa, e ao recebê-la, eu me levantei educadamente, agradeci o tempo do meu
entrevistador, e expliquei as razões porque não poderia aceitar a oferta. A
minha reação surtiu efeito, e saí de lá com o dobro do valor oferecido
incialmente, faculdade, curso de inglês
e aluguel pagos pela empresa, e muito satisfeita.
Ainda me pergunto: como eu consegui aquela façanha? O que
mudou desde então?
Em primeiro lugar, a
oferta de profissionais. Se eu ainda não era exatamente uma “profissional”
da área, alguns fatores pesaram a meu favor: eu tinha inglês básico (mas
precisava ainda melhorar para ser considerado um bom inglês). Já tinha perfil
comercial (o que a empresa rapidamente percebeu), era boa em negociação, provei
isso quando negociei meu próprio salário, e era uma pessoa de confiança - vinha
indicada pela minha mãe, amiga de infância do administrador da empresa.
O que eu não tinha? Conhecimento de comércio exterior, mal
sabia o que era uma fatura comercial, nunca havia tido contato com estrangeiros
e sequer tinha maturidade para conduzir equipes.
Permaneci nesta empresa por 7 anos, e saí de lá como Gerente
de Exportação e procuradora de um dos sócios, assinando por ele inclusive
assuntos financeiros e de compra e venda.
Você pode estar se perguntando o que isso tem a ver com o
mercado internacional e o perfil do negociador nos últimos 20 anos? Em primeiro
lugar, é um ponto de vista pessoal, da minha trajetória profissional, um
depoimento humilde de alguém que precisou se reinventar muitas vezes ao longo
desses 23 anos de carreira.
Lá na primeira empresa onde trabalhei na área de comércio
exterior, eu precisava ser extremamente técnica: entender da documentação de
exportação, negociações com companhias marítimas, Banco do Brasil, empresas de
courier, acompanhamento de despacho de exportação junto à Receita Federal. Tudo
para que a venda realizada chegasse ao comprador final, em qualquer parte do
mundo, dentro do prazo esperado. Custos era uma preocupação menor, considerando que o cenário econômico era
caótico, e medir custos uma tarefa quase impossível. Além do mais, todo o valor
da venda da exportação poderia ser
convertido em ouro, pelo período de 20 dias a partir da chegada das divisas ao
Brasil. Isso permitia que a rentabilidade da exportação triplicasse, nessas
transações em ouro.
No início do século XXI, o que se percebeu com a chegada de
muitas multinacionais ao mercado brasileiro, foi uma procura acentuada por profissionais que
falassem inglês e espanhol e que dominassem razoavelmente o intrincado sistema
aduaneiro e o direito aduaneiro brasileiro. A burocracia era gigantesca , com
alta regulação.
Com a modernização do siscomex, que agora já pode ser
acessado via web, com linguagem mais amigável, com o fluxo de informações
correndo de forma mais intensa e rápida, permitindo comunicações em tempo real
entre os diversos continentes do planeta, novamente o perfil do profissional
sofreu mutações.
As empresas mais bem estruturadas passaram a olhar para a
área com outros olhos, e enxergou no profissional com visão estratégica, capaz
de gerir a contento os serviços terceirizados contratados, que administre muito
bem o tempo e maximize os lucros da
companhia, de forma sustentável e com criatividade, como o ideal de
profissional a ser retido como talento.
Então agora não basta saber um pouco de tudo, nem muito de
pouco. A exigência nos leva na busca do domínio máximo das competências
requeridas.
O mundo tornou-se vendedor, várias crises eclodem em
diversas partes do planeta - financeira, cultural, religiosa, ideológica.
Nossos recursos naturais estão escasseando.
É preciso encontrar a melhor solução para maximizar a utilização dos
recursos tecnológicos, na gestão do conhecimento e dos recursos financeiros da
empresa, de forma a não esgotar os recursos naturais.
No livro “Cinco Mentes para o Futuro”, Howard Garner diz que
com essas cinco mentes uma pessoa estará bem equipada para lidar com aquilo que
se espera, bem como com aquilo que não se pode prever. Sem elas, estará à mercê
de forças que não pode compreender, sequer controlar.
Então, é preciso levar em conta que sem disciplina, não se
adquire conhecimento, e pesquisas confirmam que são necessários até 10 anos
para dominar uma disciplina. Receber
informações de diferentes fontes, entender, avaliar objetivamente, reunir de
forma inteligível a si mesmo e às demais pessoas é outra habilidade muito
importante, dado o estonteante ritmo de acúmulo de informações. Já uma mente
criadora é responsável por romper barreiras, apresentar novas idéias, propor
questões desconhecidas, evocar formas inéditas de pensar e chegar a respostas
inesperadas. Para que tudo isso funcione, uma mente respeitosa observa e acolhe
diferentes seres humanos e busca trabalhar de forma eficaz com eles. Em um
mundo interligado, intolerância e desrespeito não constituem mais uma opção
viável. Em nível mais abstrato, a mente ética reflete sobre a natureza do
trabalho, desejos e necessidades da sociedade onde vive.
Embarcamos no que pode ser a globalização que tudo
englobará, apresentando 4 tendências inéditas:
-
Circulação praticamente instantânea de imensas quantidades de capitais e outros
instrumentos de mercado ao redor do planeta;
- O movimento de pessoas entre
fronteiras, com bem mais de 100 milhões de imigrantes espalhados pelo mundo a
todo o momento;
-
Informação em movimento pelo ciberespaço, com vários graus de confiabilidade,
acessível para um número inédito de pessoas;
-O
movimento rápido e contínuo da cultura popular - moda, estilo, gastronomia,
música e arte, de modo que adolescentes do mundo todo tem aparências cada vez
mais semelhante, mesmo que opiniões, valores e gostos dos mais velhos também
possam convergir.
Na minha opinião, nesse cenário desenhado por Howard Garner,
o negociador internacional precisa atuar como um multiplicador de resultados,
dentro de um perfil ético, com responsabilidade
social e de maneira criativa.
Pela minha experiência pessoal, percebo que há uma
necessidade enorme que o profissional tenha visão das oportunidades,
determinação para superar as diversas dificuldades em transformar uma idéia num
projeto, capacidade de maximizar resultados buscando alternativas criativas,
mas acima de tudo, que possua “finiciativa”.
Eu cunhei essa expressão há muitos anos atrás, ao deparar-me
com profissionais altamente pró-ativos e motivados no início de um trabalho,
mas com baixa disposição para concluir os trabalhos que iniciaram, quando as
dificuldades se apresentam. Concluir o que se começou é fundamental para
qualquer projeto. Só se pode avaliar a eficácia das ações após um período de
tempo. E abandonar a implantação ou não cuidar das etapas de controle é um
grave erro cometido por muitos profissionais.
Hoje o negociador já não precisa estar mais fisicamente
junto ao seu fornecedor ou cliente durante todo o processo de negociação. É
possível acelerar algumas etapas com o uso das tecnologias. Mas deixar tudo a
cargo dessa incrível ferramenta é acreditar que a faca elétrica será capaz de,
sozinha, cortar, deglutir e digerir o pão.
Inovação é a palavra do momento. Mas o que ela significa, para aqueles que atuam nos mercados tradicionais?
Fazer de
uma nova maneira algo que já existe;
Criar
uma nova necessidade, através de um
produto que não existia;Encontrar novas utilizações para velhos produtos e serviços.
O desafio está lançado, senhores. Cabe a cada um de nós
desenhar nosso futuro, reconhecendo nossas competências e habilidades e
encontrando disposição para desenvolver aquelas que nos faltam.
Sucesso a todos, até o próximo post!
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